O Centro de Integridade Pública (CIP) tornou públicos, esta semana, os resultados de uma investigação que expõe práticas de tráfico de influência, corrupção e violações graves de direitos no seio da magistratura moçambicana, com foco na província de Maputo. A análise, que abrange três casos ocorridos no segundo semestre de 2024, revela um padrão alarmante de má conduta entre juízas e oficiais de justiça.
Segundo o relatório, foram identificadas diversas irregularidades processuais e legais, incluindo: confisco indevido de bens, emissão de sentenças contraditórias, prisões preventivas ilegais, subornos, desvios de cauções, além de indícios claros de violação dos princípios de imparcialidade, igualdade e boa-fé por parte de magistrados.
Dois dos casos analisados foram conduzidos pela juíza Nilza Pene, acusada de ter recebido meio milhão de meticais em subornos para favorecer um cidadão irlandês em um processo de litígio conjugal. A requerente, que pedia a nulidade do casamento, viu seus bens confiscados e contas bancárias bloqueadas.
Em outro processo, também de natureza conjugal, Nilza Pene teria emitido duas sentenças contraditórias sobre a mesma causa, resultando no confisco indevido de bens do requerente.
A terceira situação envolve a juíza Judite Simeão Mahoche, que, segundo o CIP, legalizou a prisão arbitrária dos gémeos Reginaldo e Hermenegildo Chirindzane em 2016. Os dois foram detidos após disputa de terras com um agente do SERNIC, no bairro Mapulango, distrito de Marracuene, e permaneceram 11 meses em prisão preventiva, ultrapassando em mais de sete vezes o limite legal de 40 dias, conforme o artigo 308 do Código de Processo Penal então em vigor.
Além disso, os gémeos teriam pago 160 mil meticais pela sua libertação, com parte do valor sendo transferido para uma conta alheia indicada por um oficial de justiça, identificado como Ângelo Guambe, envolvido diretamente no caso e com histórico de corrupção.
Os antecedentes das juízas reforçam a gravidade das denúncias. A juíza Nilza Pene já havia sido sancionada com 30 dias de multa, conforme a deliberação n.º 126/CSMJ/P/2023, por desvio de cerca de 800 mil meticais entre 2019 e 2020, quando exercia funções no Tribunal Judicial da Machava. Por sua vez, Judite Mahoche foi expulsa da magistratura em 2017, por "incompetência profissional culposa" e "erros técnicos graves".
O oficial Ângelo Guambe, à época funcionário do Tribunal Judicial do Distrito Municipal da Matola (TJDM), também enfrenta um processo-crime por corrupção, reforçando os indícios de um esquema de tráfico de influência sistemático.
A investigação do CIP vem reacender o debate sobre a credibilidade do sistema judicial moçambicano e evidencia a necessidade urgente de reformas estruturais, responsabilização efetiva e fortalecimento dos mecanismos de controlo interno e externo dos tribunais.
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